Apropriação cultural: 6 exemplos (explicados) para entender o conceito
De modo bastante simplista e resumido, podemos afirmar que a apropriação cultural ocorre quando um indivíduo pertencente a uma cultura se apodera de determinados elementos de outra, da qual ele não faz parte.
Esses elementos podem ser de naturezas muito diversas: roupas, penteados, símbolos religiosos, tradições, danças, músicas e comportamentos, para destacar alguns exemplos.
Este conceito não é algo estanque; pelo contrário, tem sido pensado e problematizado por inúmeros teóricos e ativistas. Ainda que existam vários pontos de vista, algumas concepções parecem ser fundamentais para promover valores como a diversidade e o respeito.
Um dos aspectos incontornáveis deste tipo de apropriação é o modo como os produtos culturais são retirados dos seus contextos originais e reproduzidos em contextos totalmente diferentes.
Sem nenhum tipo de referência ou crédito, esses elementos são tratados como algo meramente estético ou lúdico.
Exemplos de apropriação cultural explicados
Embora alguns casos de apropriação cultural sejam mais sutis ou difíceis de reconhecer, existem muitos outros que são bastante óbvios e representativos. Para você entender a complexidade e a pluralidade da questão, nós selecionamos alguns exemplos.
1. Blackface e espetáculos de menestréis
Um dos exemplos mais conhecidos é o blackface, uma prática que se tornou muito popular durante o século XIX. Durante os chamados espetáculos de menestrel, um ator branco pintava o rosto com carvão, com o intuito de representar um indivíduo negro.
Nas apresentações, que pretendiam ter um teor cômico, o menestrel reproduzia estereótipos racistas com o intuito de fazer o público rir.
É importante perceber que esse suposto entretenimento perpetuava os preconceitos, alimentando a ignorância e os discursos de ódio em relação à população negra.
2. Nativos americanos nos filmes de faroeste
Outro grande exemplo de apropriação e má representação de uma cultura pode ser encontrado nos filmes de faroeste norte-americanos.
Neste tipo de cinema, os nativos americanos eram sempre apresentados ao público como vilões, figuras ameaçadoras, perigosas e "selvagens", com as quais era preciso ter cuidado.
Essas narrativas, sempre marcadas pelo preconceito e pelo medo, aumentaram o desconhecimento e a violência face aos indivíduos nativos americanos.
3. As verdadeiras origens do Rock'n'roll
Assim como o cinema, a música também tem sido um território marcado por vários casos de apropriação. Nos Estados Unidos da América, a década de 50 viu surgir o Rock'n'roll, um gênero musical que tomou conta do mundo todo.
Através de músicos como Elvis Presley, que continua sendo apontando como "Pai do Rock", alguns ritmos que nasceram na cultura afro-americana passaram a ser assimilados pelo grupo dominante.
Até então, por serem tocados e cantados por artistas negros, eles eram menosprezados ou encarados como vulgares. Alguns artistas como Presley acabaram assumindo o lugar de protagonistas do movimento, enquanto nomes como Chuck Berry ou Little Richard ficaram para segundo plano.
4. Cultura como fantasia
Um dos exemplos de apropriação cultural no Brasil, que se perpetua sobretudo na época do carnaval, é o uso de identidades ou culturas como fantasias.
Aquilo que muita gente pode ver como uma brincadeira festiva ou até uma homenagem, é encarado como um ato bastante ofensivo, já que acaba reduzindo um povo a uma mera caricatura. Na verdade, esse tipo de fantasias acaba traduzindo uma representação preconceituosa e estereotipada.
5. Cultura como produto ou moda
Algo que também é bastante comum nas indústrias da beleza e da moda é a apropriação de elementos culturais retirados do seu contexto e reproduzidos em massa, sem referência à sua história nem às tradições das quais surgiram.
6. Símbolos religiosos como adereços
Aqui, a apropriação cultural ocorre quando os símbolos religiosos de culturas que ainda são discriminadas são adotados pelo grupo dominante.
Os símbolos ligados às crenças religiosas, assim como outras expressões culturais, acabam sendo encarados como elementos estéticos, decorativos.
Um exemplo que continua bem visível é o uso de artefatos de plumagem indígena, muitas vezes usados em cerimônia e rituais, como simples adereços. O bindi (na imagem acima), um símbolo do hinduísmo, também foi encorporado na maquilhagem de várias pessoas que não conhecem o seu verdadeiro significado.
Algo parecido também permanece no Brasil, com o uso de dreadlocks ou de turbantes por indivíduos que desconhecem o seu contexto histórico e cultural.
Diferença entre Apropriação Cultural e Apreciação Cultural
O que separa o conceito de apropriação cultural de outros como "apreciação" ou "intercâmbio" é o fator da dominação. A apropriação parte de alguém pertencente a uma cultura hegemônica ou dominante.
Esse grupo dominante, de forma coletiva e estrutural, discrimina os indivíduos de outros grupos minoritários, ao mesmo tempo que adota alguns dos seus produtos culturais.
A filósofa brasileira Djamila Ribeiro explicitou a questão no texto Apropriação cultural é um problema do sistema, não de indivíduos, publicado em 2016, na revista AzMina:
Por que isso é um problema? Porque esvazia de sentido uma cultura com o propósito de mercantilização ao mesmo tempo em que exclui e invisibiliza quem produz. Essa apropriação cultural cínica não se transforma em respeito e em direitos na prática do dia a dia.
Quando essas expressões culturais pertencentes às minorias são retiradas do seu contexto, existe um apagamento da sua história. Elas passam a ser encaradas como parte (e propriedade) da cultura dominante, que recebe os créditos por algo que não criou.
Ou seja, o que parece estar em jogo é a posição de poder, os privilégios dos quais esse grupo se serve para se apropriar e reclamar algo que não pertence às suas tradições e crenças.
Djamila remata, no mesmo texto referido acima:
Falar sobre apropriação cultural significa apontar uma questão que envolve um apagamento de quem sempre foi inferiorizado e vê sua cultura ganhando proporções maiores, mas com outro protagonista.
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