13 melhores livros infantis da literatura brasileira (analisados e comentados)


Laura Aidar
Revisão por Laura Aidar
Arte-educadora, fotógrafa e artista visual

Talvez você conheça algum desses clássicos da literatura infantil e, com sorte, foi graças à uma dessas publicações que você tomou gosto pela leitura.

Esse tipo de escrita surgiu em meados do do século XVIII e, no Brasil, o gênero literário foi publicado só no início do século XIX. Muitos autores de referência da literatura brasileira dedicaram esforço e trabalho para agradar os jovens leitores.

Para além da importância didática, a leitura na infância é fundamental para despertar o interesse pela literatura e fazer com que se experimente sentimentos complexos que farão parte da vida adulta.

Descubra agora as onze histórias infantis que se tornaram clássicos e já fazem parte do nosso imaginário coletivo.

1. Bisa Bia, Bisa Bel (1981), de Ana Maria Machado

Bisa Bia, Bisa Bel

Publicado em 1981, o livro surgiu do desejo da autora de falar sobre os seus avós para os seus filhos. A protagonista é uma menina comum que, durante uma das arrumações da mãe, encontra um retrato da Bisa Bia ainda criança.

A menina não teve a oportunidade de conhecer a bisavó Beatriz, que descobriu apenas pela fotografia. Encantada com a imagem, a garota resolve pedir a fotografia emprestada para a mãe:

— Não posso, minha filha. Pra que é que você quer isso? Você nem conheceu sua bisavó...
— Por isso mesmo, para eu ficar com ela para cima e para baixo, até conhecer bem. Levar para a escola, para a praça, para a calçada, pra todo canto. Dá pra mim, dá...

A obra infantil de Ana Maria Machado aborda a memória e ensina as novas gerações a olharem e a conviverem com o passado da família.

Buscar a genealogia da família diz também sobre a construção da própria identidade da menina. Bisa Bia, Bisa Bel convida a refletir sobre as origens da família, investigando antepassados com quem não se teve a chance de conviver.

O livro traz ainda um pensamento sobre a igualdade de gênero ao mostrar personagens mulheres não só dentro da família como também em sociedade.

2. A Bruxinha Atrapalhada (1982), de Eva Furnari

capa do livro A bruxinha Atrapalhada

Um dos clássicos da literatura infantil brasileira é A Bruxinha Atrapalhada, de Eva Furnari, escritora que nasceu na Itália e veio morar no Brasil ainda criança.

O livro, lançado em 1982, não possui escrita, se comunicando apenas através dos desenhos. Assim, consegue alcançar um público amplo, já que as crianças que ainda não sabem ler também têm acesso às histórias.

A bruxinha, que está aprendendo a lidar com seus poderes, por vezes faz feitiços que não dão certo. Essa é uma maneira muito criativa de se conectar com o universo infantil, já que as crianças são seres em formação e às vezes também podem se atrapalhar no processo de se tornarem autônomas.

O livro conquistou o público e a crítica, vencendo o Prêmio Melhor Livro de Imagem para o Jovem 1982 (FNLIJ).

3. Pluft, o Fantasminha (1955), de Maria Clara Machado

capa do livro Pluft, o fantasminha

O livro é originado de uma peça de teatro de 1955. Maria Clara Machado, sua autora, era dramaturga e atriz, e esse foi seu primeiro texto de destaque.

A narrativa acompanha a amizade surgida entre Maribel, uma jovem garota, e Pluft, um fantasma que vive em uma velha casa e tem muito medo de gente.

Tímido e inseguro, Pluft vê em Maribel uma amiga e decide salvá-la, encarando seus medos.

Maria Clara Machado traz aqui uma trama bem humorada que trata com delicadeza alguns dos conflitos humanos, como o enfrentamento, o autoconhecimento e a amizade.

4. Uma Ideia Toda Azul (1979), de Marina Colasanti

Uma ideia toda azul

O livro de contos publicado por Marina Colasanti em 1979 reúne dez pequenas histórias encenadas em universos paralelos (castelos, reinos distantes, bosques encantados). As ilustrações foram feitas pela própria escritora.

As criaturas presentes nas histórias também são distantes da nossa realidade: gnomos, fadas, reis, unicórnios. O livro se inicia, aliás, com a figura do rei em meio a uma descoberta incrível:

Um dia o Rei teve uma ideia. Era a primeira da vida toda, e tão maravilhado ficou com aquela ideia azul, que não quis saber de contar aos ministros. Desceu com ela para o jardim, correu com ela nos gramados, brincou com ela de esconder entre outros pensamentos, encontrando-a sempre com igual alegria, linda ideia dele toda azul.

Colasanti cria ao longo dessas breves narrativas um universo mágico e maravilhoso que transportas as crianças para essa realidade paralela, estimulando a imaginação.

Para compor a criação, a autora se inspirou nos contos de fadas clássicos e muitas vezes fez uma releitura de histórias já presentes no inconsciente coletivo.

Como são narrativas um pouco mais complexas e quase sem diálogos, ela investiu em parágrafos curtos. O objetivo é dar fôlego ao pequeno leitor e leitora, proporcionando também uma maior legibilidade.

5. O Menino Maluquinho (1980), de Ziraldo

O menino maluquinho

O Menino Maluquinho apresenta um garoto travesso, criativo e cheio de energia. Escrito e ilustrado por Ziraldo nos anos oitenta, o livro, em formato de quadrinhos, foi adaptado mais tarde para os mais diversos meios (TV, teatro, cinema).

Na narrativa de Ziraldo encontramos como protagonista um menino que se coloca constantemente em situações de "roubada", o que traz a identificação das crianças com o personagem.

Ele é uma criança de dez anos como outra qualquer: dotada de profunda imaginação, quase sem medos, sempre disposta a descobrir algo novo e a investigar o mundo ao redor.

Conhecido pelas suas travessuras, o maior defeito do garoto, descrito como hiperativo, era não conseguir ficar parado:

Ele era muito sabido
ele sabia de tudo
a única coisa que ele não sabia
era como ficar quieto.

O que Ziraldo propõe é um desejo de fazer com que as crianças agitadas se sintam compreendidas e acolhidas pelo convívio com o seu menino maluquinho.

Além disso, é interessante assistir o pequeno garoto enfrentando uma série de desafios e situações limite, o que fortalece sua autonomia e identidade.

6. A Mulher que Matou os Peixes (1968), de Clarice Lispector

A mulher que matou os peixes

Vista como autora de uma literatura densa e pesada, Clarice costuma ser celebrada pelos seus livros de literatura adulta.

No entanto, os seus livros infantis são igualmente uma preciosidade. Escritos inicialmente para os próprios filhos, as obras foram publicadas e hoje são consideradas referências da literatura infantil brasileira.

Em A Mulher que Matou os Peixes ficamos conhecendo uma narradora culpada pelo assassinato - sem querer! - de dois pobres peixinhos vermelhos que eram os bichos de estimação dos seus filhos:

Essa mulher que matou os peixes infelizmente sou eu. Mas juro a vocês que foi sem querer. Logo eu! Que não tenho coragem de matar uma coisa viva! Até deixo de matar uma barata ou outra. Dou minha palavra de honra que sou pessoa de confiança e meu coração é doce: perto de mim nunca deixo criança ou bicho sofrer.

A narradora compõe a história com o intuito de convencer o leitor da sua inocência, afinal os peixes não foram mortos intencionalmente. O que aconteceu foi que ela esqueceu, no meio da sua rotina ocupada, de colocar comida no aquário.

Para provar a sua inocência, a mãe volta para a sua própria infância e conta histórias sobre os animais de estimação que já teve. Clarice coloca-se assim no lugar do público - assumindo o seu lugar enquanto criança - e espera que o seu público também seja capaz de se colocar no lugar dela.

A narradora, ao longo das vinte e poucas páginas, ensina o pequeno leitor a lidar com a dor e com a perda, e também exercita nos pequenos a capacidade de compreensão e do perdão.

7. Chapeuzinho Amarelo (1970), de Chico Buarque

Chapeuzinho amarelo

A protagonista da história de Chico Buarque ilustrada por Ziraldo é uma menina que basicamente tem medo de tudo.

Chamada de Chapeuzinho amarelo (uma referência à Chapeuzinho Vermelho dos irmãos Grimm), a garota temia as situações mais comuns no universo das crianças: cair, se machucar, sentir uma indisposição qualquer.

Ela também tinha pavor de animais, de trovão, até de dizer coisas tinha medo (pela possibilidade de se engasgar). Estagnada, o medo acabava tornando a sua rotina extremamente difícil.

A história encoraja as crianças a enfrentarem os seus medos particulares e as empodera,estimulando-as a seguir em frente.

Não tem mais medo de chuva nem foge de carrapato. Cai, levanta, se machuca, vai à praia, entra no mato, trepa em árvore, rouba fruta, depois joga amarelinha com o primo da vizinha, com a filha do jornaleiro, com a sobrinha da madrinha e o neto do sapateiro.

Leia uma análise completa do Livro Chapeuzinho Amarelo, de Chico Buarque.

8. Ou Isto Ou Aquilo (1964), de Cecília MeirelesOu isto ou aquilo

Em Ou Isto Ou Aquilo, Cecília Meireles ensina que é impossível fugir das escolhas. Através de exemplos simples e cotidianos, faz com que se perceba que, ao longo do caminho, é preciso escolher.

Estar atento e consciente é fundamental para se decidir entre uma coisa ou outra, afinal, seja qual for a opção, a escolha implicará sempre perda. Ter algo significa imediatamente não ter a outra hipótese.

Ao longo dos poemas vemos que a personagem procura se identificar com o universo infantil apresentando cenários que a criança provavelmente já experimentou no seu dia-a-dia.

Ou se tem chuva e não se tem sol
ou se tem sol e não se tem chuva!
Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!

Outro ponto importante é que os versos costumam ser extremamente musicais e compostos a partir de rimas para facilitar a memorização e o entusiasmo do público leitor.

Conheça também 10 poemas imperdíveis de Cecília Meireles.

9. Papo de Sapato (2005), de Pedro Bandeira

Papo de sapato

Pedro Bandeira é um dos autores mais populares da literatura infantil brasileira. Em Papo de Sapato o escritor parte de uma ideia bem criativa: e se os sapatos pudessem contar histórias?

É no meio do lixão que os sapatos velhos e sem uso são descobertos. Encontra-se desde as botas antigas de um general, que já testemunharam duras batalhas, até a sapatilha de uma grande bailarina e as chuteiras de um famoso jogador de futebol.

Todos os sapatos, agora na mesma condição de abandono, trocam memórias sobre as experiências que tiveram com os seus donos:

- E eu? - lamentou-se uma voz aristocrática. -
Pode não parecer, mas eu fui um brilhante sapato de verniz.
Uma noite enluarada como esta me faz lembrar as festas em que estive, nos pés de um cavalheiro de alta linhagem, rodopiando pelos salões da aristocracia, roçando no ritmo das valsas, as pontas dos sapatinhos mais elegantes, calçados pelas mais belas mulheres do mundo!

A criação de Pedro Bandeira nos faz pensar na sociedade de consumo que muitas vezes estimula a compra e depois o descarte. Também convida o leitor e a leitora a refletir sobre justiça social.

Quando a publicação fez 25 anos, a história ganhou ilustrações de Ziraldo.

10. Marcelo, Marmelo, Martelo (1976), de Ruth Rocha

Marcelo Marmelo Martelo

Marcelo é o protagonista dessa história contada por Ruth Rocha e lançada em 1976. Assim como toda criança curiosa, ele faz uma série de perguntas aos pais, o que já promove uma identificação imediata com quem lê.

— Papai, por que é que a chuva cai?
— Mamãe, por que é que o mar não derrama?
— Vovó, por que é que o cachorro tem quatro pernas?
As pessoas grandes às vezes respondiam.
Às vezes, não sabiam como responder.

O título do livro faz menção à uma das maiores dúvidas de Marcelo: por que as coisas têm determinados nomes? Inconformado, Marcelo decide dar novos nomes àquilo que considera não combinar com o nome que originalmente têm.

O pai de Marcelo tenta rebater as inquietações do filho argumentando que precisamos usar as mesmas palavras porque se não o mundo ficaria uma loucura.

A explicação, no entanto, não convence o esperto Marcelo, que segue exercitando a sua criatividade para rebatizar o universo ao redor.

Em seu livro infantil, Ruth Rocha investiga a persistente curiosidade das crianças e o gesto de questionar o já pré-estabelecido.

11. O Meu Pé de Laranja Lima (1968), de José Mauro de Vasconcelos

O Meu Pé de Laranja Lima

Lançado em 1968 - período de plena ditadura militar no Brasil - a obra de José Mauro de Vasconcelos é assumidamente autobiográfica. O livro fez tanto sucesso que foi adaptado para o cinema e televisão.

O protagonista Zezé é um garoto cheio de energia - como costumavam dizer, o menino "tinha o diabo no corpo". Muitas vezes os adultos ao redor não compreendiam as necessidades do menino e acabavam injustamente o punindo.

Criado no subúrbio do Rio de Janeiro, a rotina de Zezé se transforma quando o pai perde o emprego e a família precisa se mudar porque já não é capaz de manter as mesmas condições de vida.

Apesar de ter três irmãos (Glória, Totoca e Luís), Zezé se sentia muito incompreendido e sozinho e acaba criando amizade com o pé de laranja lima que tinha no quintal. É com ele que Zezé partilha todas as suas dúvidas e angústias.

O Meu Pé de Laranja Lima ensina as crianças sobre as injustiças e trata também do pesado tema da negligência durante a infância.

O livro ilustra bem como as crianças tendem a se refugiar no seu próprio universo particular quando se sentem acuadas ou com medo.

Descubra mais sobre O Meu Pé de Laranja Lima, de José Mauro de Vasconcelos.

12. Reinações de Narizinho (1931), de Monteiro Lobato

Reinações de narizinho

Quem não se lembra das histórias passadas no sítio do Picapau Amarelo? Reinações de Narizinho, lançado em 1931, tem como pano de fundo um sítio que realmente existiu, situado no interior de São Paulo.

O cenário escolhido por Monteiro Lobato serviu de ambiente para personagens inesquecíveis como a Dona Benta, a Tia Nastácia, a Emília e o Pedrinho.

Numa casinha branca, lá no sítio do Pica-pau Amarelo, mora uma velha de mais de sessenta anos. Chama-se dona Benta. Quem passa pela estrada e a vê na varanda, de cestinha de costura ao colo e óculos de ouro na ponta do nariz, segue seu caminho pensando:
— Que tristeza viver assim tão sozinha neste deserto...
Mas engana-se.

Nesta publicação vemos dois universos paralelos convivendo em harmonia: personagens do mundo "real" (Pedrinho, Dona Benta e Tia Nastácia), com criaturas do universo "imaginário" (saci, cuca, princesas encantadas).

O objetivo maior do autor era fazer com que as crianças de fato mergulhassem na história. Lobato queria transformar a leitura em um hábito prazeroso e cotidiano dos pequenos.

O autor também usa o livro para valorizar a cultura nacional, motivando jovens desde cedo a conhecerem mais as nossas raízes e lendas.

13. A Arca de Noé (1970), de Vinícius de Moraes

A arca de noe

Vinicius parte de uma história bíblica (a da Arca de Noé) para encantar os leitores e leitoras.

Inicialmente, o poeta começou a escrever para os seus próprios filhos, especialmente para a filha Susana, nascida em 1940, e para Pedro, em 1942.

Depois Vinicius teve a ideia de musica-los e, para isso, pediu a ajuda do músico Paulo Soledade (1919-1999). Muitos anos mais tarde, em 1970, com o nascimento da filha Maria, Vinicius fechou uma parceria com o seu grande amigo Toquinho para musicar os poemas infantis.

Apesar de ser ateu, Vinicius nos versos voltados para as crianças faz uma homenagem à diversos personagens bíblicos. A ideia da arca foi bastante atraente do ponto de vista editorial porque permitiu reunir poemas antigos dedicados à diferentes animais.

A arca desconjuntada
Parece que vai ruir
Entre os pulos da bicharada
Toda querendo sair
Afinal com muito custo
Indo em fila, aos casais
Uns com raiva, outros com susto
Vão saindo os animais

A história da mitológica arca de Noé faz parte do inconsciente coletivo, sendo familiar tanto para adultos quanto para crianças. Aliás, é o poema da arca que inaugura o livro, reunindo todas as espécies.

Ele é seguido de poemas ilustrando os mais diferentes bichos como O Pinguim, O Leão, A Cachorrinha, O Pato, A Galinha d’Angola e O Peru.

A ideia do dilúvio introduz nas crianças o sentido de reconstrução, a necessidade de se ter esperança e de se reerguer outra vez, mesmo após uma tragédia.

A presença dos bichos faz com que elas reflitam sobre a vida em comunidade e a noção de que partilhamos o mundo com outras espécies.

Cada animal possui as suas qualidades e defeitos, a cooperação e a convivência entre eles é também um espaço para o aprendizado da tolerância.

Os poemas escritos por Vinicius foram musicados, o disco A Arca de Noé está disponível online:

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Laura Aidar
Revisão por Laura Aidar
Arte-educadora, artista visual e fotógrafa. Licenciada em Educação Artística pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e formada em Fotografia pela Escola Panamericana de Arte e Design.
Rebeca Fuks
Edição por Rebeca Fuks
Formada em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2010), mestre em Literatura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2013) e doutora em Estudos de Cultura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e pela Universidade Católica Portuguesa de Lisboa (2018).