Poema Quadrilha, de Carlos Drummond de Andrade (análise e interpretação)


Carolina Marcello
Carolina Marcello
Mestre em Estudos Literários, Culturais e Interartes

Quadrilha é um poema de Carlos Drummond de Andrade, publicado em 1930, na sua primeira obra Alguma Poesia. Trata-se de uma célebre composição que fala sobre as dificuldades e os desencontros do sentimento amoroso.

Assim como em outros poemas do autor, aqui o que está em jogo é a solidão do sujeito no mundo e a sua dificuldade em estabelecer laços com aqueles que o rodeiam.

Capa do livro Alguma Poesia (1930)
Capa e primeira folha do livro Alguma Poesia (1930) de Carlos Drummond de Andrade.

Quer entender melhor o significado de Quadrilha? Confira a nossa análise abaixo.

Poema Quadrilha

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi pra os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.

Escute o poema declamado pelo próprio autor:

Análise do poema Quadrilha

Carlos Drummond de Andrade foi um dos poetas que integraram a segunda geração do modernismo brasileiro. Quadrilha, como outras composições do autor, incorpora algumas características do movimento: o verso livre, as formas populares, as temáticas do cotidiano e linguagem coloquial.

A princípio, este parece ser um poema de tom quase infantil que narra paixões adolescentes. O seu desfecho, no entanto, remete para a vida adulta e suas vicissitudes.

Primeira metade

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.

Os primeiros três versos do poema apresentam várias paixões não correspondidas. Todos os indivíduos, menos Lili, amavam sem serem amados de volta.

Desde o começo, podemos perceber que a confusão de sentimentos e os desencontros sucessivos marcam a história que o sujeito está narrando. Fica evidente a ideia de que o amor não é fácil de achar e muito menos de se concretizar.

Segunda metade

João foi pra os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.

Nos quatro versos restantes, ficamos conhecendo o destino dos personagens que foram apresentados acima. Descobrimos que uns partiram e outros morreram.

Todos parecem ter ficado sozinhos ou deixado escapar o amor, seguindo seus destinos em diferentes direções. Do grupo, a única que se casou, afinal, foi Lili ("que não amava ninguém").

A referência ao seu marido surge de forma bastante impessoal, sem um nome próprio. "J. Pinto Fernandes" aparenta ser uma designação comercial, que identifica um negócio ou uma empresa, não uma pessoa.

Assim, o uso do termo pode insinuar que existe um relacionamento distante, ou até de interesse, entre o casal. De qualquer forma, o poema sublinha a imprevisibilidade da vida e do próprio sentimento amoroso.

Com humor e também com alguma tristeza, o poema reflete sobre os desafios que os indivíduos encontram nas vivências das suas paixões e que diminuem as possibilidades de encontrar um relacionamento feliz.

Interpretação e significado do poema Quadrilha

O título do poema parece ser uma referência à dança que virou tradição nas festas juninas brasileiras. Metaforizado pela quadrilha, o amor surge como uma dança onde os pares estão trocados e os sentimentos não são correspondidos.

Quase todos estão apaixonados e são alvo da adoração de alguém, mas as linhas parecem estar cruzadas e nenhum relacionamento cresce ou se concretiza.

Com uma perspectiva bastante pessimista, o sujeito poético retrata o amor como algo absurdo, uma espécie de jogo de sorte que apenas alguns têm a oportunidade de vencer.

De forma simples e usando exemplos concretos, do cotidiano, a composição ilustra o desespero do sujeito, e daqueles que os rodeiam, para quem o amor verdadeiro parece ser praticamente impossível.

Sobre Carlos Drummond de Andrade

Carlos Drummond de Andrade (31 de outubro de 1902 — 17 de agosto de 1987) é um dos maiores nomes da literatura brasileira, sendo apontado como o maior poeta nacional do século XX.

Retrato de Carlos Drummond de Andrade.
Retrato de Carlos Drummond de Andrade.

Membro da segunda geração do modernismo brasileiro, Drummond teve um enorme impacto no nosso panorama literário, com uma obra poética que quebrou as tradições das escolas anteriores.

Focados nas questões sociopolíticas da época mas também nas experiências e emoções do indivíduo, os seus poemas se caracterizam por terem uma linguagem acessível e abordarem temas do cotidiano, abandonando preocupações formais antigas, como a rima.

Explore mais sobre o autor e confira a nossa análise dos poemas mais famosos de Carlos Drummond de Andrade.

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Carolina Marcello
Carolina Marcello
Mestre em Estudos Literários, Culturais e Interartes e licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Apaixonada por leitura e escrita, produz conteúdos on-line desde 2017, sobre literatura, cultura e outros campos do saber.