7 personagens de Dom Casmurro analisadas
Uma das obras-primas de Machado de Assis, Dom Casmurro é um romance atemporal que foi publicado em 1899. Repleto de simbologias, o enredo é um retrato da sociedade carioca da época, expondo fragilidades e vícios morais.
O livro, narrado pelo protagonista, funciona como uma retrospectiva através da qual ele tenta explicar o que aconteceu na sua vida. As personagens, com características complexas e singulares, merecem uma análise aprofundada.
1. Bentinho / Santiago / Dom Casmurro
O narrador e protagonista da história é chamado por vários nomes, ao longo da narrativa, que correspondem a fases distintas da sua personalidade. Inicialmente é Bentinho, um garoto introvertido e inseguro que vive protegido pela família, principalmente por Dona Glória.
Embora não queira ingressar no seminário, ele é incapaz de recusar ou contrariar a matriarca. Por outro lado, a paixão por Capitu, sua vizinha e amiga de infância, o leva a rejeitar a ideia de ser padre.
Assim, ele sempre está dependente da ajuda externa, precisando dos planos de Capitu e dos conselhos de José Dias para se libertar desse destino.
Após abandonar os estudos religiosos e frequentar a universidade, ele passa a se chamar Bento Santiago. Não é mais um menino, mas um advogado bem-sucedido, e tem oportunidade de controlar a sua vida. Nesse momento, pode finalmente casar com Capitu e iniciar uma família.
Com a chegada de Ezequiel, o filho do casal, Santiago se mostra um homem dedicado, amoroso e presente. No entanto, a sua paixão por Capitu vira ciúme e sentimento de posse. Esse cenário piora com a morte repentina do melhor amigo, Escobar. Vendo como a esposa chora no velório, ele começa a suspeitar que os dois tinham um caso extraconjugal.
A partir daí, se torna paranoico e desconfiado, reparando nas semelhanças entre Ezequiel e Escobar, o que o leva a negar a paternidade do garoto.
Abandonando a família na Europa, como vingança, ele se transforma num velho teimoso, amargo e solitário. Passa, então, a ser conhecido no bairro como Dom Casmurro, se transformando numa espécie de anti-herói local.
2. Capitu
Capitolina é vizinha e amiga de Bentinho desde a infância. Descrita como uma menina alta, de olhos claros e atentos, ela sempre agiu de forma mais madura que o companheiro. Sua família tinha menos posses que os vizinhos, o que não a impediu de sonhar com luxos e riquezas.
Por isso, muitas vezes é acusada de futilidade e vista como uma mulher ambiciosa em demasia. Extremamente inteligente e determinada, ela acaba assumindo uma posição de dominância no começo do relacionamento.
Decidida a casar com o namorado, cria vários planos para ele escapar do seminário. Capitu cogita até a chantagem e decide se aproximar de Dona Glória, conquistando a sua simpatia. Por essas e por outras, várias personagens a encaram como manipuladora e uma potencial ameaça.
José Dias, o "agregado" da família, afirma que ela tem "olhos de cigana oblíqua e dissimulada", insinuando que pode esconder segredos ou segundas intenções. Gradualmente, o marido também começa a duvidar do seu caráter e fidelidade.
Assombrada pelo ciúme de Santiago, ela tem um final trágico: é abandonada com o filho, exilada de todos, e acaba morrendo na Europa. Embora sua traição nunca chegue a ser provada (já que tudo é baseado nas impressões do narrador), a personagem ficou lembrada como adúltera.
Permanece, então, a dúvida que atormenta os leitores: Capitu traiu ou não traiu? Mentiu para Santiago ou foi vítima da sua obsessão doentia? Quanto a isso, não existem respostas definitivas, apenas a interpretação de cada um.
3. Escobar
Escobar é o terceiro vértice do triângulo amoroso, real ou fictício, que acaba destruindo a vida do casal. Ele conhece Bentinho no seminário e, assim como o protagonista, não tem vocação para o sacerdócio.
Rapidamente, se torna o seu melhor amigo, com quem o adolescente confidencia a sua paixão por Capitu e o desejo de abandonar o local.
Loiro, de olhos claros e "fugitivos", o jovem era misterioso e, por vezes, se mantinha em silêncio. O seu comportamento e a forma como é descrito sugerem que ele poderia estar escondendo alguma coisa.
Escobar também deixa o seminário e consegue enriquecer no mundo do comércio, com a ajuda do amigo e um empréstimo inicial de Dona Glória.
Ele se casa com Sancha, amiga de infância de Capitu, e se torna padrinho de Ezequiel (que, aliás, ganha o seu primeiro nome). A sua morte repentina é um momento de viragem na narrativa, provocando uma derrocada até ao final.
Passando a ser encarado como amante de Capitu e pai ilegítimo da criança, ele se transforma no maior rival do protagonista. Sua memória assombra Dom Casmurro e, como ele está morto, não pode sequer esclarecer a história ou contar a sua versão dos fatos.
4. Dona Glória
Viúva de Pedro de Albuquerque Santiago e mãe de Bentinho, Dona Glória é uma mulher rica, bondosa e protetora, agarrada às tradições e à religião. Ainda jovem e bonita, vive apenas em função do filho, que mima de todas as formas.
Generosa, ela abriga várias pessoas na sua casa, com o objetivo de ajudá-las: é o caso de José Dias, Tio Cosme e Prima Justina.
O seu desejo de ser mãe era tão forte que Glória fez uma séria promessa: o filho seguiria o sacerdócio. Por causa disso, ela vive dividida entre a vontade de ter Bentinho por perto e a obrigação de enviá-lo para o seminário.
Assim, quando chega a hora, a viúva decide forçar o menino a seguir o destino que foi determinado para ele. No entanto, vendo a insatisfação de Santiago, acaba permitindo que siga os estudos universitários e se case com Capitu.
Embora, no começo, seja a grande inimiga da relação, a mãe acaba gostando da sua nora e apoiando a felicidade dos dois.
5. José Dias
Simpático e sofisticado, José Dias é um médico e velho amigo da família que passou a viver em casa de Dona Glória. O "agregado", como é conhecido por lá, gosta de conversar e dar boas gargalhadas com todo mundo.
Vestindo roupas elegantes, com um estilo antigo, ele se mostra sempre perspicaz e, por vezes, até parece adivinhar certas coisas, antes delas acontecerem.
Primeiro, para agradar à dona da casa, apoia a ida de Bentinho para o seminário e defende a sua vocação. Contudo, também é o primeiro a reparar na paixão que está nascendo entre o garoto e Capitu.
Passando a ocupar o lugar de uma figura paternal para o protagonista, José Dias se torna seu maior aliado nas aventuras que se seguem. Com seus truques e capacidade de persuasão, o "agregado" consegue livrar o jovem do seminário e acompanhá-lo nos estudos superiores.
Apesar de tudo isso, ele também é o primeiro que alerta Santiago e a sua família sobre a personalidade dissimulada de Capitu. Embora seja ignorado, na época, mais tarde todos se recordam das suas palavras.
6. Tio Cosme
O habitante mais velho da "casa dos três viúvos", Cosme é irmão de Dona Glória. Descrito como um homem grande, encorpado e tranquilo, ele nunca se envolve nas confusões que o rodeiam.
Durante muitos anos, foi um advogado que defendia suas ideias com paixão e vitalidade. No entanto, com o tempo, ficou mais cansado e foi perdendo a vontade de se sobressaltar ou perder a paciência.
No meio de todas as confusões, o tio mantêm uma postura neutra e amigável e, mesmo observando tudo que acontece, nunca pronuncia a sua opinião ou tenta resolver os problemas alheios.
7. Prima Justina
Ao contrário de Cosme, Justina é uma viúva fechada e intransigente. A prima de Dona Glória, que vive com ela por necessidade financeira, assume uma postura hostil e "do contra", em várias passagens da obra.
Mesmo quando todos defendem que Bentinho deve ser enviado para o seminário, Justina discorda, porque consegue reconhecer que ele não tem vocação para ser padre.
Sempre desconfiada, teimosa e até ciumenta com aqueles que chegam ao local, é a única que não muda de ideias acerca da Capitu, continuando a questionar a sua índole.
O mesmo acontece com Escobar, o amigo de Santiago, por quem nutre uma profunda antipatia, ainda que o resto da família se encante com ele.
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