Livro Felicidade Clandestina, de Clarice Lispector
Publicado em 1971, o livro de contos Felicidade Clandestina reúne vinte e cinco narrativas breves. Alguns dos trabalhos editados já haviam sido publicados em jornal anteriormente, outros foram composições inéditas produzidas para a antologia.
A coletânea abarca obras-primas como Menino a bico de pena, O ovo e a galinha e Restos de carnaval.
Sobre o livro
Os contos reunidos na antologia Felicidade Clandestina são passados entre o Recife e o Rio de Janeiro, entre os anos de 1950 e 1960. Alguns dos trabalhos presentes no livro possuem forte traço autobiográfico, outros são composições completamente descoladas do cotidiano da autora.
A coletânea é bastante heterogênea, tanto no que diz respeito ao conteúdo quanto em relação a forma. Alguns trabalhos versam sobre a infância, outros sobre a solidão, outros hesitam sobre dilemas existenciais. No que diz respeito a extensão, não existe qualquer padrão, algumas narrativas são breves, outras são longas.
Contos presentes no livro na ordem de aparição
- Felicidade clandestina
- Uma amizade sincera
- Miopia progressiva
- Restos do carnaval
- O grande passeio
- Come, meu filho
- Perdoando deus
- Tentação
- O ovo e a galinha
- Cem anos de perdão
- A legião estrangeira
- Os obedientes
- A repartição dos pães
- Uma esperança
- Macacos
- Os desastres de sofia
- A criada
- A mensagem
- Menino a bico de pena
- Uma história de tanto amor
- As águas do mundo
- A quinta história
- Encarnação involuntária
- Duas histórias a meu modo
- O primeiro beijo
Resumo do conto Felicidade Clandestina
Com forte cunho autobiográfico, o conto Felicidade Clandestina tem duas protagonistas: uma menina egoísta, gorda, baixa, sardenta, rica, filha do dono de uma livraria, e a sua colega da mesma idade que era uma leitora ávida.
A história se passa no Recife, cidade onde viveu Clarice durante a infância.
A narradora vivia pedindo emprestado para a menina os livros que ela não lia, mas a garota recusava-se veementemente a emprestar.
A situação se repetia todos os dias até atingir o ápice da crueldade, quando a narradora descobriu que a filha do livreiro tinha o tão desejado exemplar As reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato.
A menina prometeu ceder o livro, mas todas as vezes que a narradora ia a sua casa ouvia que o exemplar estava emprestado para outra pessoa. Foram dias a fio vivendo essa rotina torturante, até que a mãe da menina percebeu o que estava se passando.
Muito surpresa com a situação, a mãe disse que o livro nunca saíra daquela casa e que a filha nem sequer o leu. Decepcionada com os requintes de crueldade da menina, fez questão de emprestar o livro e dizer que a jovem poderia ficar com ele o tempo que desejasse.
A alegria total e absoluta reinou quando finalmente a garota pode ter acesso As reinações de Narizinho:
Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre iria ser clandestina para mim. Parece que eu já pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar... Havia orgulho e pudor em mim. Eu era uma rainha delicada.
Às vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo.
Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante.
Leitura do conto Felicidade Clandestina feita pela atriz Aracy Balabanian:
Conheça Clarice Lispector
Nascida no dia 10 de dezembro de 1920, na Ucrânia, e batizada como Haia Pinkhasovna Lispector, Clarice adotou o nome brasileiro foi morar no nordeste quando ainda era bebê (com dois meses). Os pais (o casal Pinkouss e Mania Lispector) fugiam da Guerra Civil Russa, ocorrida entre os anos de 1918 e 1921.
O primeiro destino dos pais foi Maceió, depois a família se instalou no Recife. Quando completou quinze anos, Clarice mudou para o Rio de Janeiro. A jovem cursou direito na Universidade Federal do Rio de Janeiro, embora nunca tenha exercido.
No que diz respeito a vida pessoal, casou-se com o diplomata Maury Gurgel Valente, e juntos tiveram dois filhos (Pedro e Paulo).
Em 1940, publicou o seu primeiro conto, intitulado Triunfo, em uma revista.
Sua primeira obra literária de peso foi o romance Perto do coração selvagem, escrito aos 19 anos de idade e publicado em 1944. Já nessa primeira criação era possível perceber o tom intimista característico da autora. Com o título recebeu o Prêmio Graça Aranha, concedido pela Academia Brasileira de Letras em 1945.
Seu livro de contos Laços de Família, também foi premiado, dessa vez com o Prêmio Jabuti.
Clarice foi colaboradora assídua da imprensa, começou nos anos 1960 tendo participado inclusive de diversas edições do Jornal a Noite, do Correio da Manhã e do Jornal do Brasil.
No Jornal do Brasil publicou crônicas semanalmente entre 1967 e 1972. Muitas vezes assinou suas publicações em jornal com pseudônimos como Helen Palmer e Tereza Quadros.
Seu último livro publicado em vida foi A hora da estrela, lançado em 1977. Clarice morreu em 9 de dezembro de 1977, aos 56 anos de idade.
Considerada uma escritora modernista (pertencente a Geração de 45), Clarice deixou uma vasta obra publicada que contempla criações dos mais diversos gêneros literários.
Confira a lista abaixo:
Romances
Perto do coração selvagem (1944)
O lustre (1946)
A cidade sitiada (1949)
A maçã no escuro (1961)
A paixão segundo G.H. (1964)
Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres (1969)
Água viva (1973)
A hora da estrela (1977)
Contos
Alguns contos (1952)
Laços de família (1960)
A legião estrangeira (1964)
A felicidade clandestina (1971)
A imitação da rosa (1973)
A via-crucis do corpo (1974)
Onde estiveste de noite? (1974)
A bela e a fera (1979)
Crônicas
Visão do esplendor (1975)
Para não esquecer (1978)
A descoberta do mundo (1984)
Livros infantis
O mistério do coelhinho pensante (1967)
A mulher que matou os peixes (1969)
A vida íntima de Laura (1974)
Quase verdade (1978)
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