Caio Fernando Abreu (1948-1996) é dos escritores mais queridos da literatura brasileira e representou um marco especialmente na geração dos anos 80.
A sua produção reverbera até os dias de hoje inspirando fãs e novos autores. Conheça agora mais sobre a sua vida e obra.
Frases
Autor de frases icônicas, Caio Fernando Abreu consagrou uma série de orações sobre o amor, o desejo, a ausência e a memória. Relembre algumas dessas frases poderosas:
Preciso de você para dizer que te amo outra vez. Como se fosse possível, como se fosse verdade, como se fosse ontem e amanhã.
A passagem acima fala da relação com o outro, da necessidade de expor aquilo que sente e de viver o sentimento na sua plenitude, ainda que seja preciso se desvincular provisoriamente da realidade.
Apesar de perceber a perenidade do afeto, o sujeito que emite a oração precisa sentir que o amor é eterno: sobrevive ao passado, atravessa o presente e vence o futuro.
Meu coração é o mendigo mais faminto da rua mais miserável.
A frase acima trata da questão da carência, tantas vezes abordada na obra de Caio Fernando Abreu. Aqui há uma constatação do narrador da necessidade de amar e ser amado, de estar em interação com o outro e de sentir que faz parte de algo.
Eu não me autoconheço. E tenho medo de me conhecer. Tenho medo de me esforçar para ver o que dá dentro de mim e acabar surpreendendo uma porção de coisas feias, sujas.
Caio escreveu muito sobre o autoconhecimento e o trecho acima é um desses momentos em que reflete sobre a sua ignorância em relação a si mesmo.
Se conhecer significa também entrar em contato com o que há de ruim internamente e o medo de dar conta desses afetos faz com que a viagem seja interrompida.
Amor não resiste a tudo, não. Amor é jardim. Amor enche de erva daninha. Amizade também, todas as formas de amor. Hay que trabalhar y trabalhar, sabe?
O amor foi um tema constante que atravessou a escrita Caio. Na frase acima o narrador constata que, ao contrário do que as pessoas costumam crer, o amor não supera todas as barreiras - antes pelo contrário, ele precisa ser cuidado, tratado, regado. O amor (não só o romântico, também o amor entre amigos) é sinônimo de constante trabalho.
Poemas
Embora Caio seja bastante falado devido aos seus poemas, a verdade é que o autor publicou pouquíssimos exemplares em vida e o grande público só pode conhecer esse manancial lírico depois de reunido e publicado postumamente.
Para sermos mais precisos, em vida Caio publicou apenas quatro poemas (Prece e Gesto, divulgados pelo Jornal Cruzeiro do Sul no dia 8 de junho de 1968, e Oriente e Press to Open que saíram no Suplemento Literário de Minas Gerais já na década de 70).
Em 2012 as pesquisadoras Letícia da Costa Chaplin e Márcia Ivana de Lima e Silva lançaram a obra Poesias Nunca Publicadas de Caio Fernando Abreu reunindo uma série de materiais que ficaram entre amigos e parentes do autor.
Os grandes temas que moveram o Caio poeta foram o amor, a solidão, a finitude, a incompletude, o afeto, o desencontro e o erotismo (especialmente o homoafetivo).
Descubra agora três exemplares da poética de Caio Fernando Abreu:
Breve memória
Porém não sabes.
E ainda que soubesses
mais adiante,
e um roteiro pasmado de agonia
calcasse em mim sua vontade,
ainda assim
não saberias.
uma garra de ferro ou de amianto
nos vitrais da porta escancarada.
É tarde
(amigo
amado):
repousa com os que tens
e não me penses
aqui
ou noutra esquina. Silencia,
como eu. Repleto.
Que no teu corpo o menino que tu és
e não pressentes
se faça num cantar
flor e varanda. E um rumor
de fugas e cantigas
te faça adormecer
desamparado.
Os versos acima fazem parte do trecho final do poema Breve memória, composto durante a década de 60. Nessa ocasião Caio ainda estreava na lírica, o público estava habituado apenas a lê-lo em prosa.
Dividido em cinco partes, o poema Breve memória, como o próprio título alude, convoca ao passado e sublinha a ausência e o desamparo.
A questão da solidão figura em uma série de poemas de Caio, ainda que em muitos deles o eu-lírico se encontre fisicamente acompanhado do amigo amado).
Pour la route
Quem sabe o Mozart si loin,
maybe a tarde entre os loureiros,
peut-être le coucher du soleil?
Chamam nomes na memória:
ah inverno que não acaba nunca
ah vontade de chorar sem dor.
Pelo tempo, pelas perdas,
pelas coisas, pelas gentes,
que passam e passeiam pelas notas do piano,
janelas de TGV, hotéis, insônias,
gares, mochilas, cabines.
Tudo outra vez, entre a bruma
desta última tarde em Bordeaux.
Escrito em março de 1993, em Bordeaux, o poema que leva o nome do lugar guarda o registro dessa viagem e de um Caio já mais maduro, que descobriria no ano a seguir a infecção por HIV.
Nos versos acima encontramos um tom saudosista, de quem guardou na memória um período de plenitude e de descoberta.
As lembranças registradas armazenam tanto imagens de cenas e objetos quanto recordações e afetos.
Stone song
Eu gosto de olhar as pedras
que nunca saem dali.
Não desejam nem almejam
ser jamais o que não são.
O ser das pedras que vejo
é só ser, completamente.
Eu quero ser como as pedras
que nunca saem dali.
Mesmo que a pedra não voe,
quem saberá de seus sonhos?
Os sonhos não são desejos,
os sonhos sabem ser sonhos.
Eu quero ser como as pedras
e nunca sair daqui.
Sempre estar, completamente,
onde estiver o meu ser.
Composto em 1996, ano em que o escritor morreu, o poema de versos livres apresenta uma contemplação da natureza e faz uma constatação da permanência em oposição a inquietação natural do seu humano.
Caio especialmente foi uma criatura que esteve em constante movimento: saiu do interior de Porto Alegre, se mudou para São Paulo, durante a ditadura militar se exilou na Europa e regressou ao Brasil quando as coisas melhoraram politicamente.
No poema Stone song as pedras simplesmente são: não almejam, não se decepcionam, não têm desejos. O homem, ao contrário, reverbera, aspira, sofre, se reinventa, muda, por isso, de certa forma, inveja a serenidade e a constância da pedra.
Descubra outros grandes poemas de Caio Fernando Abreu.
Biografia
Onde e quando nasceu Caio Fernando Abreu?
O escritor nasceu em Santiago do Boqueirão (interior do Rio Grande do Sul) no dia 12 de setembro de 1948.
A carreira literária
Caio começou a escrever com seis anos e em 1966, aos dezoito anos, publicou o seu primeiro conto chamado O príncipe sapo na revista Cláudia.
Amante de literatura, entrou no curso de Letras e de Artes Cênicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, mas abandonou a graduação sem se formar.
Em 1968 se mudou para São Paulo para trabalhar na redação da revista Veja.

O período da ditadura militar
Em 1971 se mudou para o Rio de Janeiro onde trabalhou nas redações das revistas Manchete e Pais e Filhos.
Em 1973, com o peso dos anos de chumbo, resolveu se exilar na Europa tendo vivido em Londres e Estocolmo.
Quando foi a morte de Caio Fernando Abreu?
Diagnosticado com AIDS em 1994, Caio Fernando Abreu voltou a morar com os pais em Porto Alegre.
O autor faleceu de complicações da doença na capital do Rio Grande do Sul no dia 25 de fevereiro de 1996.
Prêmios
O escritor venceu três vezes o Prêmio Jabuti na categoria Contos, Crônicas e Novelas. As obras premiadas foram: Triângulo das Águas (1984), Os Dragões Não Conhecem o Paraíso (1989) e As Ovelhas Negras (1995).
Recebeu também o Prêmio Moliere (1989) pela peça A Maldição do Vale Negro (1988).
Seu romance Onde Andará Dulce Veiga? arrebatou o Prêmio da APC, de melhor romance do ano em 1991.
Filme Onde andará Dulce Veiga?
A adaptação cinematográfica do livro Onde andará Dulce Veiga?, lançado em 1990, aconteceu em 2008 sob a direção de Guilherme de Almeida Prado, amigo próximo de Caio.
A protagonista da história no cinema é Maitê Proença, que vive uma cantora desaparecida nos anos 60. Diante do mistério, um repórter - não por acaso chamado Caio, assim como o escritor - vai investigar esse desaparecimento ao lado de Márcia (vivida por Carolina Dieckman), que é filha da cantora.
Confira o trailer:
Livros
Caio Fernando Abreu flutuou por entre os gêneros e tem uma série de obras publicadas que vão desde o teatro, as crônicas, contos, romances, novelas e literatura infantil.
Sua obra publicada contempla os seguintes títulos:
- Limite Branco (1970)
- Inventário do irremediável (1970)
- Ovelhas negras (1974)
- O Ovo Apunhalado (1975)
- Pedras de Calcutá (1977)
- Morangos Mofados (1982)
- Triângulo das Águas (1983)
- Pequenas epifanias (1970)
- As Frangas (1988)
- Mel e Girassóis (1988)
- Os Dragões Não Conhecem o Paraíso (1988)
- A Maldição do Vale Negro (1988)
- Onde Andará Dulce Veiga? (1990)
- Ovelhas Negras (1995)
- Estranhos Estrangeiros (1996)
- Caio Fernando Abreu: Cartas (2002, organização de Ítalo Moriconi)
- Além do ponto e outros contos (2010)
- A Vida Gritando nos Cantos (2012)
- Poesias Nunca Publicadas de Caio Fernando Abreu (2012, organização de Letícia da Costa Chaplin e Márcia Ivana de Lima e Silva)