A vida invisível é um filme brasileiro do diretor Karim Aïnouz lançado em 2019. É uma obra cinematográfica inspirada no livro A vida invisível de Eurídice Gusmão (2016), da escritora e jornalista pernambucana Martha Batalha.
A produção participou do Festival de Cannes, ganhando o prêmio Um certo olhar e foi a escolhida para representar o país na busca pelo Oscar de 2020, mas não foi selecionada.
(Atenção, o artigo contém spoilers!)
Trailer e sinopse de A vida invisível
A vida das irmãs Guida (Julia Stockler) e Eurídice (Carol Duarte) é narrada nesse drama que se passa, na maior parte do tempo, nos anos 40 e 50.
Aqui, vemos duas mulheres que têm suas vidas atravessadas pela ignorância masculina e acabam se distanciando.
Guida apaixona-se por um jovem estrangeiro e decide seguir com ele, deixando a família. Ao retornar, é impedida pelo pai de pertencer ao núcleo familiar novamente.
Enquanto isso, Eurídice, a irmã mais nova, constrói uma trajetória aparentemente "ideal", exercendo os papéis de mãe, esposa e filha, mas deixando de lado o grande sonho de ser pianista.
Por conta desse infeliz desencontro, ambas passam a vida toda buscando uma pela outra.
Resumo e análise crítica do filme A vida invisível
A trama, definida como um "melodrama tropical", vem agradando o público e crítica ao proporcionar uma experiência sensível, emocionante e que traz muitas reflexões sobre o sistema patriarcal em que vivemos.
Trata-se de um filme de romance, entretanto, o afeto declarado é o amor entre irmãs e a solidariedade entre mulheres, que convencionou-se chamar hoje em dia de sororidade.
Assim, a história busca evidenciar as agruras de toda uma sociedade ao exibir as situações pelas quais as personagens passam. Situações essas que tem o poder de deixar marcas em seus corpos e, sobretudo, em suas pisques.
A fuga de Guida
Logo no início da história, a jovem Guida encanta-se por Yorgos, um marinheiro grego, e resolve fugir com ele para a Grécia.
Essa decisão é tomada devido ao temperamento impulsivo e vibrante da personagem, que anseia viver amores intensos e desfrutar a vida em toda a sua potência, o que vai contra a educação conservadora e polida que recebeu em sua família, de origem portuguesa.
Assim, Guida parte e deixa uma carta para os pais e para sua irmã Eurídice, que fica desconsolada.
Nesse momento, identificamos o caráter rebelde de Guida, que não se contenta com aquela vida vigiada e busca autonomia e prazer.
O casamento de Eurídice
Já a irmã Eurídice é uma moça introspectiva e bem comportada. Mas ainda assim, tem seus anseios e deseja viver de música, tocando piano em Viena, na Áustria.
De qualquer forma, para enquadrar-se na sociedade, ela acaba casando-se com Antenor (Gregório Duvivier). A festa de casamento é marcada por euforia, ansiedade, melancolia e medo, pois percebe-se nitidamente que Eurídice não nutria sentimentos fortes pelo noivo.
A noite de núpcias é extremamente impessoal, exibindo a completa falta de sintonia entre os dois.
Mas, para além disso, e o que é pior, denota a violência sexual a que as mulheres estão sujeitas, ainda que dentro do casamento (estupro marital), o que a torna uma agressão invisibilizada.
Aqui, há a denúncia da ideia de "posse" sobre o corpo feminino, como se esse corpo pertencesse ao homem, e não à própria mulher.
Nesse contexto, cabe a expressão amplamente difundida no feminismo: "meu corpo, minhas regras". Expressão que também se aplica em muitos outros momentos, por exemplo quando, mais tarde, Eurídice se vê grávida e não deseja ser mãe, mas acaba seguindo com a gestação.
O retorno de Guida
Passado algum tempo, Guida retorna ao Rio de Janeiro, pois sua relação com o marinheiro não foi como ela esperava. A jovem, que nessa altura está gestante, volta à casa dos pais.
A princípio, sua mãe a recebe com surpresa, mas a acolhe. Depois, a jovem vai até seu pai, que estava limpando um peixe na varanda da casa.
O patriarca, interpretado por Antonio Fonseca, ao olhar sua filha grávida e perceber que ela estava sem marido, tem um surto de ira e a expulsa de casa. Quando questionado sobre Eurídice, o pai mente dizendo que ela havia se mudado para Viena.
Esse é um dos momentos mais intensos do filme, contando com atuações viscerais e elementos simbólicos que nos mostram toda a violência contida na situação.
Um desses elementos é a forma como o pai limpa o peixe e esfrega suas mãos sujas no rosto da filha grávida, aguçando outros sentidos no público, além da visão.
A impotência da mãe e a mentira sobre o paradeiro de Guida
A mãe das jovens é uma mulher igualmente silenciada. Ela gostaria de estar em contato com a filha, mas não consegue enfrentar o marido e acaba por acatar suas ordens.
Assim, quando Eurídice pergunta sobre sobre sua irmã, ela não conta que Guida havia retornado.
A eterna busca de Eurídice e Guida
As irmãs passam toda a vida tentando se reencontrar. Elas nutrem um amor imenso uma pela outra e sabem que a existência de ambas seria muito diferente se estivessem próximas, apoiando-se em seus dramas.
Elas desenvolvem então, relações de amizade e parceria com outras mulheres, que as ajudam a seguir em frente.
Assim, Eurídice chega a contratar um detetive para saber se encontra informações sobre Guida. Enquanto isso, a irmã escreve incontáveis cartas e envia para a casa dos pais, para que eles encaminhem as correspondências à Viena, onde onde teoricamente a pianista mora.
Tais cartas nunca foram entregues e as duas têm que aprender a lidar com uma ausência forçada, fruto da violência de uma estrutura machista e opressora.
A participação de Fernanda Montenegro: Eurídice na velhice
Fernanda Montenegro é um nome de peso na trama. A aclamada atriz faz participação no filme como Eurídice na fase idosa.
Na história há uma grande passagem de tempo que nos leva para o enterro de Antenor, marido de Eurídice. Então a vemos nesse momento imersa em lembranças e vazio.
Sem a presença do marido, ela e seus filhos resolvem abrir o cofre que Antenor escondia e, para sua surpresa, lá estão todas as cartas que Guida tinha mandado durante a vida.
Dessa maneira, Eurídice descobre que havia sido enganada por tantos anos e que, na verdade, sua irmã estava mais próxima do que imaginava, morando na mesma cidade, sob o mesmo sol escaldante.
Eurídice vai em busca de saber o paradeiro de Guida, mas infelizmente a irmã já havia falecido.
Fernanda Montenegro não tem muito tempo de tela, entretanto, sua magnífica interpretação vem "coroar" o filme, fazendo uma síntese das emoções vividas pelas duas irmãs e também pelo público.
Ficha técnica e pôster de A vida invisível
Título do filme | A vida invisível |
Ano de lançamento | 2019 |
Direção | Karim Aïnouz |
Elenco principal | Carol Duarte, Julia Stockler, Gregório Duvivier, Fernanda Montenegro |
Gênero | drama, romance |
Duração | 2h20 |
Classificação | 16 anos |
Entrevista com o diretor Karim Aïnouz e filmes de destaque
Confira a entrevista que Karim Aïnouz cedeu ao Canal Brasil contando um pouco sobre o filme e o processo de filmagem.
O cineasta cearense é bastante reconhecido e exibe filmes aclamados em seu currículo. Veja algumas dessas produções que se destacam em sua trajetória:
- Madame Satã (2002)
- O céu de Suely (2006)
- Viajo porque preciso, volto porque te amo (2009)
- A praia do futuro (2014)
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